Romance de estréia de Cony, originalmente publicado em 1958, O ventre parece não ter perdido nada de sua força. Nele se encontram as bases do “romance familiar” – para usar a expressão de Freud – que o autor desdobraria, mais tarde, em inúmeras obras. Às voltas com os fantasmas familiares do pai, da mãe, mas sobretudo do irmão e de um sofrido amor infantil, o bastardo José Severo avança pela vida como que despossuído de elos, de afetos, de razões, fortalecido apenas por um estranho ascetismo, que tem como prêmios o cinismo, certa inclinação para o prazer sádico e um largo vazio interior. Daí o magro, espichado e narigudo protagonista de O ventre poder ser considerado o precursor de toda uma linguagem de anti-heróis desencantados que proliferariam na ficção de Cony até a virada genial de Quase memória (1995).
O Ventre – Carlos Heitor Cony
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