Em doze pequenos contos, um rol de personagens esfarrapados e alheios ao palco principal dos acontecimentos narra, de seu ponto de vista marginal, histórias que flertam com o mágico e com o absurdo sem, no entanto, desviar-se completamente do plano factual. Em ‘As baleias de Quissico’, Jossias aguarda a chegada de um animal marinho de cuja boca, acredita, brotará ‘amendoim, carne, azeite de oliva e bacalhau’. Mas como saber se o animal existe, se ele jamais viu uma baleia? O enorme monstro que aporta sem ser visto pode ser tanto o misterioso ‘peixe grande’ como um submarino carregado de armamentos ilegais. Jossias prefere acreditar no sonho e, como ele, outros personagens de ‘Vozes Anoitecidas’ encontram mais razão na fantasia que na lógica da guerra e da privação. Ao promover uma espécie de vertigem, sob efeito da qual não se pode afirmar se uma narrativa é absurda ou se absurda é a realidade de que ela trata, o autor apresenta a perplexidade como ponto de partida para o fazer literário.
Vozes anoitecidas – Mia Couto
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