As três histórias da vida do andarilho Knulp estão entre os textos mais encantadores de Hermann Hesse. Reunindo temas depois aprofundados nas obras de grande sucesso do escritor ― a experiência existencial, a formação da personalidade, a contestação de velhos valores ―, Knulp apresenta o herói poético que influenciaria autores tão diversos como Stefan Zweig e Jack Kerouac.
Hippie avant la lettre em plena Alemanha do fim do século XIX, um jovem Knulp vagueia de cidade em cidade e se hospeda na casa de conhecidos, que lhe dão teto, comida e algum afeto. Ele evita, no entanto, construir relações mais profundas, estabelecer laços definitivos: é um amante da liberdade, uma espécie de esteta em fuga de um mundo crivado de imposições e crenças antiquadas. À medida que os anos passam, amigos o repreendem por ter desperdiçado seu talento e sua saúde com uma existência vadia, entregue à boemia e ao improviso. O andarilho, ainda que debilitado, não lhes dá ouvidos e segue desfrutando dos prazeres mais simples, aferrado aos breves momentos de felicidade.
Uma das mais belas construções literárias de Hermann Hesse, Knulp é um personagem também complexo, que duvida constantemente de suas próprias escolhas. Esse modo de vida marginal levaria Hesse a preconizar: Se pessoas talentosas e corajosas como Knulp não conseguem encontrar um lugar em seu entorno, o entorno é tão cúmplice disso quanto o próprio Knulp. Uma declaração que põe em xeque os padrões sociais daquele tempo ― e da atualidade.