Deborah Feldman cresceu sob um código de costumes rígidos, que regulavam praticamente tudo que dizia respeito à sua vida, desde o que ela poderia vestir e com quem poderia falar, até o que lhe era permitido ler. Integrante de um grupo de judeus hassídicos — corrente ultraortodoxa da religião — e criada pelos avós, cuja lealdade às tradições muitas vezes intrigava a mente curiosa da jovem, Deborah escondia volumes de Jane Austen e Louisa May Alcott para imaginar uma vida alternativa entre os arranha-céus de Manhattan.
Ao fim da adolescência, submetida a um aspecto comum a diversas tradições conservadoras, Deborah se vê presa em um casamento disfuncional com um homem que mal conhece. O isolamento e a intransigência da comunidade deixam o jovem casal despreparado para o relacionamento, bem como para as responsabilidades paternas que se seguem. Quando consegue enfim se afastar do bairro onde sempre morou e organizar uma rotina com algumas liberdades, a tensão entre os desejos e os compromissos religiosos de Deborah aumenta. Até que, farta de ver o marido colocar a estrita observância da tradição acima do bem-estar da família, ela decide abandonar tudo que um dia chamou de vida.
Ousado e em certa medida catártico, o livro de memórias de Deborah Feldman lança luz ao funcionamento de grupos religiosos ortodoxos que costumam ser tão misteriosos quanto intrigantes para quem vê de fora — uma narrativa tão forte que deu origem a uma minissérie de quatro episódios na Netflix. Por meio de sua impressionante história de fuga da repressão, em busca de autoconhecimento, Nada ortodoxa fala de liberdade e independência, mas também de laços e senso de pertencimento, levando-nos a refletir sobre o equilíbrio tênue entre essas noções.